A miséria da cultura
por Vladimir Safatle
Aqueles interessados na produção cultural brasileira devem ter
percebido uma equação inusitada. Enquanto a última década foi marcada
por um crescimento econômico real e pelo advento de uma dita nova classe
média, a cultura brasileira parece em ritmo de estagnação. Interessante notar que os momentos de crescimento econômico brasileiro
foram acompanhados pela consolidação da produção cultural.
O melhor exemplo foi o boom de crescimento do fim dos anos 1950 e começo dos anos 1960. Ele foi acompanhado da maturidade de nossa melhor produção literária (Guimarães Rosa, João Cabral de Melo Neto), pelo melhor de nossas artes visuais (Hélio Oiticica, Lygia Clark e o grupo Neoconcreto), pela bossa nova, pelas experiências teatrais de vanguarda e pelo aparecimento do cinema novo. Nada sequer parecido foi identificado nesta última década.
O melhor exemplo foi o boom de crescimento do fim dos anos 1950 e começo dos anos 1960. Ele foi acompanhado da maturidade de nossa melhor produção literária (Guimarães Rosa, João Cabral de Melo Neto), pelo melhor de nossas artes visuais (Hélio Oiticica, Lygia Clark e o grupo Neoconcreto), pela bossa nova, pelas experiências teatrais de vanguarda e pelo aparecimento do cinema novo. Nada sequer parecido foi identificado nesta última década.
Não é possível colocar a conta da improdutividade em alguma espécie
de espírito geral de época. Vemos vários exemplos de países que
conseguiram nesses últimos anos apresentar produção cultural
significativa. A Argentina e seu cinema de alta qualidade, que vem desde
as produções de Lucrecia Martel, é um exemplo paradigmático. Poderíamos
lembrar ainda do Chile e de sua literatura (Roberto Bolaño foi sem
dúvida um dos grandes escritores do começo do século). Mesmo a China com
seu crescimento tem apresentado bons artistas plásticos, além de uma
impressionante quantidade de intérpretes relevantes de música erudita.
Várias são as razões que podemos levantar para esta
miséria da cultura brasileira, com suas honrosas exceções. Podemos
começar pensando sobre o cinema nacional. Desde Cidade de Deus
(Fernando Meirelles, 2002), o cinema nacional parece ter se acomodado à
exposição da vida social, a partir das lentes da violência espetacular e
da visualidade de alto impacto herdeira da estilização publicitária.
Uma via coroada com Tropa de Elite e que parece expor como o
desejo de constituir uma indústria do entretenimento transformou-se na
essência da produção cultural nacional.
Continua aqui.
S.
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