sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

sábado, 24 de dezembro de 2011

gentileza

gentileza
não dói
não sufoca
não cobra taxa
não pede favor

gentileza
não polui
não pesa
não engarrafa
não faz de conta

gentileza
não causa insônia
não busca voto
não falsifica
não envergonha

gentileza
não arranha
não quebra
não empurra
não interrompe

por que eu não a usaria?

esperem por mim
pois a estrada é escura e efêmera

esperem de mim, portanto
a calmaria
por gentileza

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Desorientação

Você está desnorteado. Estamos eu, você, desnorteados. Todos os nossos amigos estão desnorteados. Eles olham para nós como se esperassem alguma resposta, alguma dica infalível, o mais comezinho dos conselhos. Eles entendem que estamos todos desnorteados? Ligamos para os números errados, lembramos das datas irrelevantes, desconfiamos de quem confia em nós, acreditamos que vivemos em prateleiras, e que se exibir deveria ser a principal de nossas tarefas. Permitimos sermos comprados, quando deveríamos ser seduzidos. Decidimos que devemos ser guiados pelas convenções sociais, ainda que nosso pulso reaja virulentamente à falta de apreço por nossa identidade. Aceitamos o sentimento de vergonha por tentarmos sair do comportamento padronizado, ainda que sem justificativa. Abrimos mão de questionar. Entendemos como legítima a ideia de que para sermos livres, temos que nos prender a dogmas carregados de falhas. E não nos damos nem ao trabalho de perceber o nível desse paradoxo. Achamos o bastante sermos informados de maneira rasa e medíocre, acreditamos em excesso no cara engomado da TV, como se ele fosse o oráculo dos nossos tempos. Tempos estranhos, tempos incertos, tempos empoeirados. Tempo sem nome.

Tempo impiedoso, que nos desnorteia e que nos suga o escasso ar respirável. Dormimos pouco, pensando no dia que ainda nem começou. Nas cobranças que nos fazem. E naquelas que fazemos a nós mesmos. Nossos amigos também? Precisamos correr, é o que nos foi dito. Mas esperamos ansiosamente pela extensão do pedido. Até onde correremos, e por quanto tempo? Em razão de quê? Quanto do nosso silêncio é feito de serenidade, e quanto de temores?

Queremos um pouco de sombra, queremos ouvir vozes que nos confortem, queremos uma bebida forte que nos entorpeça, queremos dizer foda-se indiscriminadamente, queremos ouvir músicas que nos façam agir como crianças, queremos bater palmas para a verdade. De verdade. Nos prometem o paraíso, mas sonegam o fato de que o paraíso não é um fim. Somos frágeis. Estamos acuados. Eu disse a mim mesmo que isso não é necessariamente uma coisa ruim, será que eles permitem que eu diga isso a eles? Um dia a mais é um dia que não é mais meu. Estamos todos desnorteados.

Encostei a cabeça no travesseiro. Espero não perder uma parte do sono, preocupado com o dia que ainda nem começou.
S.