terça-feira, 23 de março de 2010

Holofote

Do que Pernambuco precisa? Saneamento? Emprego? Escolas e hospitais mais equipados? Segurança? Transporte público decente?

Ora bolas, é evidente que Pernambuco precisa de...

(Da série: "Como ninguém percebeu isso antes?" / João Alberto, 22.03.10)

O que seriam das políticas públicas sem as atentas observações das colunas sociais, essas legítimas representantes do nosso provincianismo e da nossa cultura "tenho-que-babar-o-ovo-de-alguém-pra-chegar-em-algum-lugar".
S.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Fato

Se a vida nos amadurece com o tempo, eu não tenho certeza. Mas que ela nos embrutece à medida que os anos passam, não há dúvidas.
S.

terça-feira, 16 de março de 2010

Debilidade

Um shopping. No parque onde está o Hospital Psiquiátrico da Tamarineira.

Pausa. Esse fetiche por shoppings...

Quem deveria estar internado mesmo?

---

Uma novela sinistra
Texto de Joca de Souza Leão, publicado no JC, dia 02/03/2010
(texto recebido via e-mail)

O prefeito do Recife sabe muito bem que prefeito, qualquer um, de qualquer lugar, não é nada mais nada menos que um mandatário. Também sabe, estou certo, o que mandatário quer dizer. “Aquele que recebe mandato ou procuração para agir em nome de outro; executor de ordens ou mandados, de atos autorizados pelo mandante, em cujo nome e sob cuja responsabilidade age. Exemplo: vereador e prefeito são mandatários do povo. Não inventei nada. Tá no Dicionário Houaiss (só os grifos e exemplos são meus).

Pois bem, quem ordenou, mandou ou autorizou que se construísse um shopping center na Tamarineira, em área tombada pelo patrimônio histórico estadual? O mandatário atual diz que não mandou, que nem sabia de nada (sic). Como a coisa foi feita à sorrelfa e já faz algum tempo, vai ver que se algum mandatário mandou, foi o anterior. Não interessa. Um ou outro, se alguém mandou, usurpou. Porque o povo e as entidades que o representam não foram consultados. E nem ele, o mandatário, tem poder para destombar nada.

Recebi dezenas de e-mails e telefonemas sobre a ameaça de construção desse shopping na Tamarineira. Nada a favor. Aliás, tudo, rigorosamente tudo, que vi, li e ouvi até hoje é contra qualquer coisa de pedra e cal que se pretenda construir ali. Uns mais, outros menos contundentes, mas todos contra. Se havia alguém a favor, não aparecia. Não botava a cara. Nem dava o nome. Era um projeto órfão.

Semana passada, finalmente, os protagonistas dessa novela sinistra saíram das sombras e botaram a cara ao lume. A Santa (e misericordiosa) Casa e a carioca Releasis Empreendimentos Imobiliários assinaram e publicaram uma nota conjunta, em que a primeira diz que alugou (não vendeu) e a segunda conta (como favas contadas) que vai construir um shopping.

A Santa (e misericordiosa) Casa pode muito, é rica e poderosa, mas, até onde se sabe, não permite ou deixa de permitir que se construa nada nesta cidade. E o comprador (ou inquilino, como revelaram agora), idem; também não permite ou deixa de permitir coisíssima alguma. Pelo menos é o que se imagina.

Eu disse anteriormente que o projeto do shopping era “órfão”. Mas, melhor dizendo, era de pai desconhecido. Era. Porque as investigações de paternidade revelaram fortes indícios de que o pai seria Dom José Cardoso Sobrinho, à época o mandão da Santa (e misericordiosa) Casa. Seguinte: tudo faria parte de um ardiloso plano de vingança de Dom Cardoso, que teria ido às forras contra o Recife, porque o povo amava Dom Hélder e o ignorava solenemente. (Posso, até, imaginá-lo lá no esconderijo onde se refugiou, vociferando com sua voz cavilosa: “A vingança será maligna!”).

Mas não tem nada perdido. Desde a década de 50 que a Santa (e misericordiosa) Casa ameaça vender a Tamarineira. E já naquela época, aqui mesmo neste JC, o cronista Mário Melo questionava a legitimidade dessa propriedade, citando documentos do século XIX, existentes no Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico. Recentemente, a historiadora e pesquisadora Virgínia Pernambucano de Mello desencavou um documento de 1925, do governo de Sérgio Loreto, que coloca a Tamarineira sob a gestão do Estado de Pernambuco.

Ora, ora, conterrâneos, como dizem os juristas, “o Direito é bom”: o mandatário não manda (e não mandou), a área é tombada e, de quebra, ninguém pode alugar o que não é seu.

À luta! À justiça! À vitória! Ao Parque Público da Tamarineira (sem shopping). E viva o tema da Campanha da Fraternidade 2010: Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro.

Joca Souza Leão é batizado, crismado, eleitor no Recife e morador do Espinheiro, bairro adjacente à Tamarineira.
S.

Tempestade no Cerrado: não seja um desertor

As capas dos jornais paulistas, das revistas semanais e o casal do JN não negam: a guerra de 2010 já começou.

---
Texto de Mauro Carrara

Operação “Tempestade no Cerrado”: o que fazer?

(O PT é um partido sem mídia... O PSDB é uma mídia com partido).

“Tempestade no Cerrado”: é o apelido que ganhou nas redações a operação de bombardeio midiático sobre o governo Lula, deflagrada nesta primeira quinzena de Março, após o convescote [ver post do dia 1º de março - S.] promovido pelo Instituto Millenium.

A expressão é inspirada na operação “Tempestade no Deserto”, realizada em fevereiro de 1991, durante a Guerra do Golfo.

Liderada pelo general norte-americano Norman Schwarzkopf, a ação militar destruiu parcela significativa das forças iraquianas. Estima-se que 70 mil pessoas morreram em decorrência da ofensiva.

A ordem nas redações da Editora Abril, de O Globo, do Estadão e da Folha de S. Paulo é disparar sem piedade, dia e noite, sem pausas, contra o presidente, contra Dilma Roussef e contra o Partido dos Trabalhadores.

A meta é produzir uma onda de fogo tão intensa que seja impossível ao governo responder pontualmente às denúncias e provocações.

As conversas tensas nos "aquários" do editores terminam com o repasse verbal da cartilha de ataque.

1) Manter permanentemente uma denúncia (qualquer que seja) contra o governo Lula nos portais informativos na Internet.

2) Produzir manchetes impactantes nas versões impressas. Utilizar fotos que ridicularizem o presidente e sua candidata.

3) Ressuscitar o caso “Mensalão”, de 2005, e explorá-lo ao máximo. Associar Lula a supostas arbitrariedades cometidas em Cuba, na Venezuela e no Irã.

4) Elevar o tom de voz nos editoriais.

5) Provocar o governo, de forma que qualquer reação possa ser qualificada como tentativa de “censura”.

6) Selecionar dados supostamente negativos na Economia e isolá-los do contexto.

7) Trabalhar os ataques de maneira coordenada com a militância paga dos partidos de direita e com a banda alugada das promotorias.

8) Utilizar ao máximo o poder de fogo dos articulistas.

Íntegra do texto aqui.
S.S.

domingo, 14 de março de 2010

Janela


As articulações doíam. O sono ainda era forte, ainda que o relógio tivesse avançado bastante. Ele olhou de lado e viu que ela ainda dormia. Ou fazia de conta que dormia. Acho que minha conversa a derrubou antes da vodca, pensou ele. Com esforço, retirou a cabeça do travesseiro e foi até a janela. Olhou ao redor, a respiração ainda ofegante. Veio a sensação de sempre, quando observava os outros: As pessoas parecem mais dispostas que eu. E eu acabei de acordar... que merda!, pensou. A vida resolveu martelar minha testa com mais força. Os dias estranhos me reencontraram, e só os deuses e os cães sabem disso, falou pra si em silêncio.

De fato, ele estava diferente. Estranho. Cansado. Irritadiço. Tudo o desarranjava. Gente futriqueira. O calor absurdo. Motoristas ruins. Os esnobes e os medíocres, nada mais que dois lados de uma mesma moeda. Pessoas infelizes. E tristes, por não conseguirem escapar da própria desventura. Droga! Acabei de levantar e já estou desse jeito... com certeza eu a derrubei antes da vodca, pensou ele, girando a cabeça pra ver se ela ainda sonhava.

Como é que tanta gente se conforma? Como é que um grupo tão reduzido de donos do mundo pode inverter as prioridades de uma multidão? Como é que eles fazem isso? Como conseguem fazer do patético e do vazio elementos indispensáveis para a vida de milhões? A vida não é curta, como os publicitários dizem. A vida é longa, mas frágil. Trocaram o adjetivo, para que os comerciais do uísque e das picapes não ficassem tão desabonadores. À profusão de pensamentos, seguiu-se uma risada veloz e uma tosse nem tão curta. Foi nessa hora que ele percebeu que ela estava de olhos abertos.

Você está bem?, ela perguntou. Fecha a janela. Não vai dormir mais?, prosseguiu. Tô bem, só vim olhar a rua um pouco, ele retrucou. Você está com uma cara estranha, ela afirmou. Tô nada, você que está vendo coisas. Você sempre vê coisas demais. Quer ouvir uma música? Eu tava com Roadhouse Blues coçando na cabeça. Deixa pra lá, volta a dormir antes que eu te obrigue a tomar o resto da vodca, disparou ele, respondendo suas próprias perguntas. Ela mostrou aquele sorriso que servia de alimento para os que não tinham rumo. Ele fechou a janela, mas sabia que àquela altura já havia algo grudado em seu cérebro.

Definitivamente, os dias estranhos tinham voltado.
S.

Glauco (1957-2010)

E o mundo fica ainda mais careta.

E mais estúpido.
S.

quinta-feira, 4 de março de 2010

Automenosprezo e racismo

Texto de Luís Carlos Lopes

Ao contrário de vários povos, o brasileiro tem a mania de se automenosprezar, de se achar menor e de assumir culpas de fatos e problemas que não são seus. Se há corrupção, é que todos seriam corruptos. Facilmente, deslizes pequenos cometidos pelos pobres são comparados aos atos deliberados agentes de Estado e de ladrões engravatados (empresários) que enriquecem com o dinheiro público. Segundo este vício terrível, os brasileiros seriam menores por terem origem nos negros africanos, nos índios das Américas e nos portugueses, vindos para cá para roubar. O caráter nacional da população desse país teria nascido torto e sem solução. Por compensação, os habitantes do Brasil teriam uma natureza geográfica exuberante e, Deus, de fato, seria nascido aqui.

Estas afirmações não são tão difíceis de serem compreendidas. Observe-se que nelas há uma tentativa de ocultar o que é possível ver a olho nu. A autofagia brasílica tem origem colonial, foi refundada no Império e reafirmada na República. Nela, se misturam o olhar do colonizador e criador dos fundamentos culturais dominantes do país com o dos colonizados que se miraram no espelho dos que vieram para cá e se apossaram deste pedaço das Américas. Nesta visão, tudo de bom era o que vinha de fora, aqui era o lugar para acumular riquezas de modo fácil e usar dos lucros para comprar as mercadorias do além-mar.

Os racismos antinegros e anti-ameríndios têm a idade do início da colonização, logo, cinco séculos. A inferiorização das maiorias foi estendida aos seus descendentes, gerando um sentimento de menoridade e incapacidade até mesmo nas elites mestiças. Este modo de ver o mundo deixou raízes profundas e se escamoteou em vários modos de dizer que os brasileiros eram um povo de segunda classe. Jamais isto foi inteiramente superado, persistindo de algum modo até o século XXI. O modo de falar isto já não é o mesmo do passado. Mas, o racismo continua presente em fontes insuspeitas, por exemplo, nas emissões da tv aberta. Nelas, os índios praticamente não existem e os negros, apesar de serem a maioria dos habitantes do Brasil, têm apenas uma cota informal, conseguida com bastante dificuldade e muito recentemente.

Íntegra do texto aqui.
S.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Piquenique dos pitbulls

Hoje, dia 1º de março, tomou corpo em São Paulo (onde mais?) o Fórum Democracia e Liberdade de Expressão. A lista de palestrantes é um sucesso: inclui, entre outros expoentes do pensamento progressista, Roberto Civita (diretor da Editora Abril), Arnaldo Jabor (Globo) e Reinaldo Azevedo (colunista da revista Veja).

E se a lista não é atrativa o suficiente, que tal o preço da inscrição? A entrada individual custa R$ 500. Isso mesmo. Quinhentos reais. Como diria o poeta Fausto Silva: "Ô loco, meu!" Quer encontro mais democrático e livre do que esse? Só na Coreia do Norte.

O encontro vai ser tão pluralista que os três mediadores do "debate" (Luís Erlanger, Tonico Pereira e William Waack) são funcionários da Rede Globo. É a furibunda direitona brasileira perdendo a vergonha na cara. O que vem em seguida? O "ressurgimento" da Democracia, como aquele celebrado pelo editorial de um jornal carioca em 1964?

De repente o dia 1º de abril era mais apropriado.

---

Artigos sobre o convescote udenista aqui e aqui.
S.