sexta-feira, 26 de junho de 2009

Reflexões sobre o cordialismo molenga

O famoso mito diz que o brasileiro é a representação do homem cordial, sempre disposto a não entrar em conflito com o outro ou com os ditames sociais, a menos que o desacordo atinja o nível do intolerável.

Sinceramente eu não sei se somos cordiais, ou simplesmente acomodados. Para não dizer bundões mesmo. Temos uma dificuldade imensa em nos mobilizarmos em torno de propostas mais elevadas e menos egoístas. Imagino se é possível ver no Brasil atual uma mobilização social em proporção semelhante à que toma o Irã no momento. Independentemente das informações desencontradas e dos interesses geopolíticos que estão em jogo no país asiático, milhões de pessoas decidiram correr o risco de perder a vida em nome de seus princípios, uma vez que lá, diferente de cá, vigora uma Teocracia das mais radicais.

A maior parte das nossas mobilizações nacionais, quando não foram guiadas, foram forçadas por uma estrutura vertical de poder. A base da população sempre acaba entrando num rearranjo de poder que vem roteirizado por quem já está em cima. Taí a abolição da escravatura e a independência que não me deixam passar por um completo mentiroso. As mobilizações que nos acostumamos a ver tendem a se dissipar ao menor sinal de um vento mais forte.

A última grande mobilização política do país foi o "Fora Collor", com seus caras-pintadas. E qual foi o estopim do movimento? O confisco da poupança. Fomos às ruas apenas quando mexeram em nosso bolso. O conflito se tornou pessoal demais.

A regra segue em outros âmbitos que não o oficialmente político. Parada Gay. Marcha da Maconha. Passeata de estudantes contra o aumento da tarifa do transporte público. Greve de professores. Greve de policiais. Greve de médicos. Todas reúnem facilmente milhares, quando não milhões. Mesmo totalmente legítimas, todas elas têm como semelhança a representação de nichos da sociedade. A sensação é de que perdemos a capacidade de nos mobilizarmos como nação, seja por uma política decente, seja por mais proteção à Amazônia, seja por uma mídia mais plural e transparente, seja por educação pública de qualidade, seja por qualquer outra coisa que transborde a bacia dos nichos. É como se tivéssemos decidido, ainda que em silêncio, que o melhor a fazer é cuidarmos das nossas migalhas enquanto a barbárie absoluta não chega.

Ou, de repente, essa capacidade nunca existiu. A gente apenas se conforma e balbucia um comentário indignado durante a reportagem da TV. E depois rimos do comercial de cerveja. De repente, sempre vestimos essa carapaça de acomodação e egoísmo, que espera pacientemente pela próxima briga, menos por princípios e mais por conveniências.

Sendo verdade, é triste.
S.

2 comentários:

Robson Fernando de Souza disse...

Também muito lamentável é quando, em vez de pensarem em mobilização, algumas pessoas dizem que querem ir embora do país por ser muito violento, corrupto etc.

Escrevi uma mensagem no esforço de inverter esse costume: Carta para quem está desistindo do Brasil e querendo ir embora

Robson Fernando de Souza disse...

Como o Blogger não tem serviço de trackback, posto manualmente mesmo: reproduzi esse texto aqui: http://conscienciaefervescente.blogspot.com/2009/07/reflexoes-sobre-o-cordialismo-molenga.html

Abração