Para a centésima postagem, indico o texto do deputado Paulo Rubem Santiago, que nos lembra que enquanto a política brasileira ficar presa em CPIs e picuinhas imbecis, e em disputas cegas pelo poder, o país vai continuar nadando de braçada na lama do atraso.
O Brasil pede por debates profundos em vários âmbitos. Junto a esses debates deve vir o questionamento de modelos e estruturas de poder que têm um caráter imutável, quase sagrado. É bom lembrar que o modelo financeiro norte-americano tinha essa aura sacra, até que descambou para uma crise endiabrada.
Além disso, é bom observar que muita gente, imprensa em especial, adora falar que o estado suga grande parte da riqueza do país, e gasta mal. Mas ninguém menciona a tal "dívida" que o país paga religiosamente aos banqueiros. Esse sim, um verdadeiro assalto à nação. Fica a conclusão de que o Brasil não é de forma alguma um país pobre. Mas um país absurdamente injusto.
Como diz o texto, acaba ficando tudo no faz de conta. O povo faz de conta que fica indignado. E a classe dominante faz de conta que está interessada em alguma mudança.
O texto é de fevereiro de 2009, e vale ser lido.
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A democracia do capital e do "faz de conta" social
por Paulo Rubem, para Celso Furtado, Florestan Fernandes e Paulo Freire
A publicação de recente pesquisa da CNT - Confederação Nacional do Transporte, em conjunto com o Instituto SENSUS, de Minas Gerais, gerou comentários entusiasmados, de um lado, e, desesperados, de outro. Entusiasmados, petistas da máquina federal e aliados bem servidos em diversas esferas do governo viram na popularidade atingida pelo Presidente Lula (84%) o sinal verde para a vitória nas eleições de 2010, lendo-se nessa pesquisa a resposta afirmativa do apoio popular ao governo.
Os desesperados, do PSDB e Democratas, começam a querer acelerar a escolha de um nome dessa aliança para que assim se faça marcação cerrada a cada passo de Lula e Dilma, a provável candidatura do governo em 2010.
De nossa parte não nos embriagamos com essa pesquisa nem pretendemos deixar o país refém do maniqueísmo governo Lula x PSDB e Democratas.
O PDT participa do governo Lula. O Ministro Carlos Luppi tem tido posições firmes em defesa dos direitos dos trabalhadores em meio a crise mundial em curso. O partido, entretanto, afirma a necessidade de um aprofundamento do debate das políticas em curso no país, de um novo projeto de desenvolvimento, sobretudo nas esferas tributária, fiscal e orçamentária, particularmente nas área onde a economia se descolou da política, a macroeconomia.
A melhor forma de analisarmos os limites do governo que integramos é através da análise das contradições da economia, sobretudo na luta pela divisão das riquezas entre a ocupação do trabalho, as políticas sociais e as rendas do capital.
Eleito e reeleito com expressivo apoio popular o governo Lula não ousou mexer no centro da acumulação interna e externa das elites, ou seja, permitiu que a dívida pública e a acumulação via títulos públicos permanecesse intacta, pagando regiamente aos credores, enquanto postergou a implantação de direitos sociais fundamentais em quantidade de acesso e em qualidade previstos desde a Constituição Federal de 1988.
Os mais embriagados com a popularidade do governo afirmam que Lula recebeu o governo de FHC com a relação dívida pública / produto interno bruto chegando a 60% e que hoje a mesma é de aproximados 38%.
Escondem o quanto se pagou do tesouro nacional a uma minoria que não vê riscos em seus negócios e que acumulou mais de R$ 1 trilhão de ganhos com juros (mais precisamente R$ 1,267 trilhão) entre 2000 e 2007, atravessando as eras de FHC e Lula.
Tudo isso para que a “governabilidade” não fosse arranhada por ameaças de bancos e “investidores” internos e externos, nem por chantagens de um congresso onde o governo afirma ser minoritário (será que o é mesmo?).
Felizmente o país não está dividido apenas entre o PT e a dupla PSDB-DEM. Felizmente o pensamento econômico de nossas universidades está aí, a fluir de forma crítica, sobre temas considerados verdadeiras religiões, autênticos fundamentalismos econômicos travestidos de opção responsável na área monetária, no câmbio, na área fiscal, sobretudo.
Para vermos o tamanho do disparate cometido nesses período sugiro a leitura de um artigo do professor Márcio Pochman, hoje Presidente do IPEA, publicado na coletânea "Impostos, de onde vem, Gastos Públicos, para onde vão", organizado pelo Professor João Sicsu, publicado pela Boitempo Editorial, em 2007, em São Paulo.
No artigo intitulado "Gasto Social, o nível de emprego e a desigualdade da renda", Pochmann afirma, na página 74, que "os recursos comprometidos com o pagamento da dívida pública terminam sendo improdutivos do ponto de vista da geração de postos de trabalho. Em 2005, por exemplo, a despesa com encargos da dívida pública de R$ 157 bilhões (8,1%) do PIB, significou a contenção de 521 mil postos de trabalho que poderiam ter sido abertos em todo o país, caso fosse aplicada na área social".
Mais adiante, à página 77, diz também que "enquanto programas como o Bolsa Família garante a 8 milhões de famílias o acesso a um benefício monetário, cujo montante representa somente 0,3% do PIB, a política de juros do governo federal transfere anualmente a poucas famílias ricas uma quantia monetária equivalente a 7% do PIB. Por conta disso torna-se muito difícil conter a desigualdade de renda e riqueza no Brasil".
Desejamos boa leitura a todos e que essa leituras, seguidas de outras sugestões que faremos, ampliem nossa capacidade crítica e que isso nos sirva à construção de um outro programa de desenvolvimento para o país a partir de 2011.
Com o fim do 2o. mandato de Lula fecharemos um ciclo de 16 anos de oportunidades perdidas, com o país sendo submetido à supremacia dos interesses e ameaças do capital financeiro, oportunidades que se somarão a outras, denunciadas por Celso Furtado em 1994, no seu livro "Brasil: a construção interrompida".
em tempo :
Em 2005, 56% de todo o volume de gastos sociais foram pagos com encargos da dívida pública.
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